MELANIE,
A DESCOBERTA DE SI MESMA
Melanie saiu para o
quintal da sua casa, depois da discussão que estava se tornando rotineira entre
seus pais, ora pelas dificuldades financeiras ora pelas reclamações de sua mãe
a respeito do cheiro de bebida que seu pai carregava na boca, quase todos os
dias, quando chegava em casa depois do trabalho repetitivo na linha de
produção.
Na cidade operária, no
oeste do estado, moravam os empregados da maior fábrica recém-instalada naquela
região, que ainda não tinha perdido totalmente a monotonia rural para dar lugar
à agitação urbana.
Deitou-se debaixo da
imensidão de estrelas que podia ser vista daquele lugar, ainda não afetado pela
poluição. Ficou tentando identificar as constelações e pensando no dia de hoje,
no de amanhã também. Melhor, pensava na sua jovem vida, imaginado o seu futuro.
“Como gostaria de sair daquele lugar atrasado, cheirando a esterco e ir para a
capital, onde vivem as pessoas importantes, chiques, famosas, cultas, como via
na televisão! Sair de mãos dadas com a felicidade e visitar museus e teatros,
estudar numa faculdade de moda e depois conhecer o mundo... Nova York, Paris...”
Já era bem tarde quando
ela percebeu uma luz caminhando pelo negrume do espaço. A luz brilhante passou
bem embaixo da lua e parecia não querer ser percebida, assim como alguém que se
desloca sorrateiramente. De repente, teve a nítida impressão que a estrela -
sim, era uma estrela cadente- encontrou o seu objetivo na observadora
silenciosa, curiosa e tinha se voltado na sua direção. Ela estava vindo direto
para a Terra, melhor, para ela, com a rapidez da luz. Naquela altura, Melanie já
estava paralisada, esperando. O coração começando a se apressar. Os olhos ofuscados
pelo brilho cada vez mais intenso, que se aproximava rapidamente, crescendo,
crescendo, crescendo...
Já não via nada, só o
brilho ofuscante... Presa, incapaz de se mover... Até que um sentimento
estranho, como se toda aquela luz tivesse entrado pelos seus olhos, eletrizante,
percorrido todo o seu corpo e, provocando calor no seu peito, se alojasse - ela
sentiu assim - no seu coração.
Melanie não se lembra como
foi para a cama naquela noite. Acordou na manhã seguinte bem cedo, sentindo
leve, diferente, como se fosse outra pessoa. Examinou o seu corpo, todos os
detalhes, mas aparentemente nada tinha mudado. Levantou-se bem disposta, abriu
a janela e a cortina e o sol entrou. Com ele uma brisa suave, perfume de flores
e canto de pássaros. Isso mesmo, perfume de flores e canto de pássaros. Nunca
tinha percebido isso nos arredores.
Naquela manhã, o sol ainda
não estava bem quente, começava a dissipar a neblina que, teimosa, insistia em
ficar por ali soprando um gelinho no seu rosto. Isso foi motivo para usar em
volta do pescoço o cachecol azul-claro que jazia pendurado no guarda-roupa,
havia muito tempo. Não se incomodou com o mau humor matinal da sua mãe e o
desânimo do seu pai, por mais um dia enfadonho. Caminhou para a escola
observando a beleza na vida simples das aves, das borboletas e dos insetinhos, felizes
- assim ela pensou - na convivência pacífica. Cada um executando a sua missão no
trabalho organizado da natureza, da maneira que a vida deveria ser.
Então,
ela percebeu que a vida tem vários aspectos e que cada ser vive a partir de
suas peculiaridades da sua subjetividade. Sem essa da necessidade de ter fé,
como lhe ensinavam, para conseguir as coisas ou evitar superstições que fazem
parte da cultura popular. Ela passou a ser mais confiante. Passou a acreditar
que tinha que procurar ser o que queria e, com vontade, conseguiria.
Deu-se conta que outra
vida corria paralela àquela que vivia socialmente, com as diferenças
individuais necessárias, em convivência nem sempre pacífica, organizadas pela
natureza, em que cada um procura satisfazer as suas necessidades diversas, suas
idiossincrasias. Outra vida... Como um ser primitivo, natural, assim como uma
fêmea do homem animal, em comunhão com a natureza, num ciclo pré-definido que
nada tem a ver com as diferenças impostas pelo homem social, que se afasta cada
vez mais das suas origens, ignorando as características subjetivas; e que toda
a vitalidade que impulsiona universo não existiria se fossemos todos iguais.
Assim, ela passou a viver
melhor as suas vidas em comunhão.
Ola,
ResponderExcluirObrigada pela sua passagem pelo meu blog e pelo seu comentário.
Vim ver os seus e gostei muito deste blog, até já estou a seguir... Escreve lindamente, parabéns!
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